Volto hoje ao vosso convívio diário para vos falar de algo que me atormenta: a hegemonia das cotonetes no sistema auricular de limpeza.
É com consternação que vejo que fomos capazes de evoluir da vassoura para o aspirador. Os nossos rudimentares regadores foram substituídos por eficazes mangueiras, capazes de verdejar o recanto mais ínfimo do nosso jardim; aos poucos o “Sonasol” foi desaparecendo, em detrimento do “Calgonit” que pauta o ritmo das nossas máquinas de lavar.
Ao invés, as nossas belas orelhas continuam a ser limpas com um bocado de algodão. O sistema não é prático, até porque o cerúmen é empurrado para dentro, algo que não é aconselhável. Os médicos insistem que a cotonete não é o sistema mais indicado, mas o que é facto é que se tornou o verdadeiro “José Sócrates” da limpeza corporal. Usamos cotonete não porque gostamos, mas sim porque não temos alternativa melhor.
Sinto um certo desconforto ao ver que fomos capazes de navegar no caminho das escovas de dentes eléctricas. E aqui impunha-se um referendo: prefere ter mau hálito e ouvir bem; ou ouvir por um funil e ter uma dentadura à Paulo Portas? Eu, por mim, até que prefiro ter mau hálito. Não sendo muito beijoqueiro, é uma bela forma de me defender contra eventuais intrusos.
Penso que esta e outras escolhas devem ser feitas no momento antecedente à evolução. Enquanto isso continuo a fazer malabarismos com a cotonete: não a quero empurrar, quero é fazer um movimento invertido em que o meu cerúmen, em ricochete, é projectado para o exterior. Acreditem que não é fácil, mas para já tem resultado bem.