Segunda-feira, 7 de Dezembro de 2009
O "Só Visto", a costeleta, o Tiaguinho e o D.José Policarpo
O “Só Visto” é como a costeleta de porco. Geralmente só como quando não tenho mais nenhuma alternativa no frigorífico. Sabiam que a elaboração do calendário foi feita tendo em linha de conta os diferentes ângulos de um círculo? Supostamente, então, teríamos apenas 360 dias, o que daria uma nova concepção da hora, dos minutos e dos segundos. Seria tudo diferente, portanto. Mas naquela reunião, em que se discutiu o tempo, levantou-se um fulano que disse. “Porque não acrescentamos mais cinco dias e tornamos tudo mais fácil?” O requerimento foi deferido. São nessas cinco dias do ano que eu como costeleta de porco e vejo o “Só Visto” na RTP.
O “Só Visto” fala das emissões anteriores do “Só Visto”. Que por sua vez falam das emissões anteriores e por aí sucessivamente. Os “Gato Fedorento” argumentam que se trata de um programa destinado a fazer as pessoas chorar. Eu concordo em parte mas acrescento. Para mim o “Só Visto” é o verdadeiro “upgrade” da TVGuia. Pegamos na revista, acrescentamos-lhe um processador mais actual, um gravador de DVD´s, criamos uma página na internet e temos um novo mundo de soluções apresentado por Marta Leite Castro.
Depois, o “Só Visto” tem uma vantagem competitiva em relação a outros programas do género. É que nos outros canais também não há alternativas melhores. Também é domingo, e ficar em frente à televisão sem confraternizar com a família é rude e inadequado. A questão TV cabo não é carta em cima da mesa. O “Só Visto” é o programa indicado para o Tiaguinho, o miúdo anti-social da família, que prefere fingir estar interessado no pequeno ecrã enquanto evita as conversas sobre os estudos e as profissões com os mais graúdos.
Geralmente tem convidados, a quem se pede que abram o coração e partilhem o lado mais íntimo com o grande público. Eu achava que era algo que se poderia fazer num grupo restrito, mas com o “Sò Visto” vemos que não anda meio mundo a enganar a outra metade. Afinal é tudo gente porreira, que só é desviada fruto das circunstâncias.
È a mensagem eucarística do fim-de-semana. Em vez do D. José Policarpo temos a Marta Leite Castro, que acaba por ser uma figura bem mais apelativa. Depois é darmos as mãos, e na tranquilidade do almoço, espreitarmos as emoções e os pulsares de alguém que supostamente teve a coragem de ir à televisão partilhar a sua vida. Who am I? You are the special one!
Sábado, 17 de Outubro de 2009
Carta de solidariedade ao meu sofá
É a divisão da minha casa que menos uso dou. Ou melhor, é a divisão mais prática, prostituta, descolorida que uma casa pode ter. Qual é o interesse de uma casa –de-banho para além da sua dimensão de limpeza e asseio?
Fazem-me confusão todos aqueles que vão ler o jornal para a casa-de-banho. Calças em baixo surge toda uma componente reflexiva que induz o pensamento e o julgamento crítico. O sofá, estático na sala, sente-se ofendido e amarrado. Ele, que é amplo e confortável, apenas se pode contentar com “As Tardes da Júlia” ou o “Preço Certo”. Agora, aquele pequeno círculo de mármore tem todo o tempo para ficar a par do que se passa do outro lado do mundo; de saber as cotações da bolsa e mesmo de descobrir alguns dos segredos da Herta Muller, o novo Prémio Nobel da Literatura.
Intriga-me. As pessoas são capazes de passar horas no IKEA, fora a posterior discussão, a ver qual o sofá que melhor se enquadra às definições da sala. De ver o seu posicionamento, a sua colocação em frente à televisão e de se estudar a sua funcionalidade correlativa com todas as outras divisões da sala. Pois bem, já dizem os holandeses que sem estereótipos seriamos todos mais felizes. Se fosse a eles substituía-os por 4 ou 5 sanitas bem redondas mesmo em frente ao LCD. Que sala bonita! A Herta Muller agradeceria.
Eu mantenho-me, e manter-me-ei, fiel à tradicional definição do sofá. Se tenho de passar tempo em casa que seja lá sentado. Na casa-de-banho limito-me ao “stop and go”. Isto claro mantendo os meus padrões de asseio e de estética. Mas digo-vos: se pintassem a parede da minha casa-de-banho de laranja eu nem sequer me iria chatear. Para mim será sempre uma divisão sem cor, que não merece a profundidade dos meus pensamentos. Tenho dito!