Terça-feira, 24 de Novembro de 2009
Carta a Deus sobre o melão

 

E Deus criou o melão. Mas enganou-se. Pois é hoje voltam os grandes pensamentos sobre alimentação. Com relevância, mais do que merecida, para o melão. É o meu fruto predilecto. O seu sabor mescla-se com o trabalho que dá para dele nos termos de servir. Invisivelmente é uma mensagem encriptada que Deus nos pretende transmitir: o que é bom dá trabalho. Temos de o abrir, cortar e depois guardar religiosamente para nova utilização. Livra!
Que bom seria que o melão pudesse trocar de formato com a maçã. No supermercado, pediriamos um quilo de melão “starking” ou “reineta”, e poderíamos desfrutar do seu sabor com mais regularidade. Afinal o que calha mesmo bem após um robalo assado é um bocado de melão. Mas, naquele momento em que estamos a ver a SIC Radical, ter que ir ao firgorifico cortar uma fatia e arrumar o resto não dá jeito nenhum. O melão em calda já veio facilitar a tarefa, mas a artificialidade com que é tratado tira-lhe todo o carisma. Sim, um melão precisa de carisma.
Por isso, Deus, te escrevo. Anda lá que eu até sou bom rapaz e não sou como aquele tipo que anda para aí a falar do Abel e do Caim a chamar-te nomes impróprios. Se concordares, eu amanhã acordo e monta-se o cenário à minha maneira: é só trocar o melão pela maçã, mantendo-se os formatos. O que Te peço não é nada de mais. Confio nos teus poderes para apagares da mente dos homens os pseudo-ruidos sensuais das dentadas de maça, as relações com as manhãs Sveltesse e toda a alegoria do pecado e da carne que lhe está associado. Gosto muito dessas mensagens mas podemos estabelecer novas relações. Aliás, até se podem manter. Que linda mulher apareceria junto de nós dando uma vigorosa e ruidosa dentada num pedaço estaladiço de melão. Como vês, tudo se pode manter. Menos o sabor.
Eu já percebi. Tudo o que dá prazer requere trabalho. Para isso já inventaste as couves e as alfaces, bem como o queijo camembert e o vinho. Agradeço-Te por isso mas deixa o melão em paz. E não entendas esta carta como uma reclamação. Encaixa-a apenas na caixa de sugestões e lembra-te que vai de um amigo que te agradece todos os dias.


publicado por Gil Nunes às 16:19
link do post | comentar | ver comentários (1) | favorito

Sexta-feira, 23 de Outubro de 2009
Dissertação sobre o pêssego - o fruto mais lisboeta de sempre

 

O pêssego. Eu gosto muito de pêssegos. Também gosto muito dos pessegueiros que dão os pêssegos. Cada vez que como um pêssego fico muito contente…
 
Caros amigos, é por este tipo de discurso à escola primária que o pêssego me causa alguma celeuma. Mas, voltando ao registo anterior, eu como pêssegos mas não compro pêssegos. Fica bem demais na fruteira, parece demasiado polido, tem uma espécie de falsidade e de arrogância perante os demais. O pêssego é sempre aquele fruto que temos de levar no elevador. É um Lawrence Welk do pomar do Sr. Vasco.
 
“Vai subir para o 6º andar? Tudo bem temos a maçã, a banana, a laranja….ah, falta o pêssego que vem já. Está só a estacionar o carro”.
 
E lá chega o pêssego todo lampeiro, nem agradecendo á maçã o facto de estar a segurar na porta.  É um estar lá, um ser agradável mas dispensável ao mesmo tempo. Digamos que no Big Brother, nas votações para sair, o pêssego era o primeiro a ser nomeado. Mas se não saísse também não fazia mal. Está ali no seu “ram-ram” de parvoíce que não incomoda ninguém.
 
Para além deste motivo eu considero o pêssego o alimento mais lisboeta de sempre. Já viram o esforço que temos de fazer para fechar os sons e obedecer ao acento? É claramente um fruto que nasceu no Bairro dos Olivais. Tenho a certeza que se tivesse nascido em Paranhos se chamaria sarapintão ou algo do género. Isso sim é um nome português, à nortenho, que até duplicaria a quantidade de sumo produzido.
 
No outro dia fui comer à Pizza Hut. Para contrapor a injecção de calorias do meu menu “Cheeseham” pedi uma salada de frutas. E ainda bem que as embalagens foram pensadas para revolucionários como eu: pois é, mal a abro surgem-me os pêssegos em primeiro lugar: seguem-se os kiwis, um bocado de alperce e só depois as maçãs, as laranjas e as peras. Com toda aquela hegemonia de pêssego, toda a salada se transforma em “salada de frutas…de pêssego” como se equiparasse àquela brilhante invenção do molho de leitão para cobrir o frango assado.
 
É claro que eu tive de intervir. Peguei na embalagem de dupla abertura e, qual cocktail, abanei-o com vigor. O pêssego foi renegado á sua real essência e o meu palato retemperado com frutas de todo o tipo, anarquicamente expostas. Em tempo de rescaldo eleitoral, viva a democracia na salada de frutas!


publicado por Gil Nunes às 11:34
link do post | comentar | favorito

mais sobre mim
pesquisar
 
Abril 2011
Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2

3
4
5
6
7
8
9

10
11
12
13
14
15
16

17
19
20
21
22
23

24
25
26
27
28
29
30


posts recentes

Carta a Deus sobre o melã...

Dissertação sobre o pêsse...

arquivos

Abril 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Maio 2009

Abril 2009

Fevereiro 2009

Janeiro 2009

Dezembro 2008

Novembro 2008

Outubro 2008

Setembro 2008

Agosto 2008

Julho 2008

Junho 2008

Maio 2008

Abril 2008

Março 2008

Fevereiro 2008

Janeiro 2008

Dezembro 2007

Agosto 2007

Maio 2007

Abril 2007

Março 2007

Fevereiro 2007

Dezembro 2006

Setembro 2006

Agosto 2006

Fevereiro 2006

Janeiro 2006

Dezembro 2005

Novembro 2005

Outubro 2005

Setembro 2005

Agosto 2005

Julho 2005

Junho 2005

Maio 2005

Abril 2005

Março 2005

Fevereiro 2005

Janeiro 2005

Junho 2004

tags

todas as tags

links
subscrever feeds
Em destaque no SAPO Blogs
pub