Terça-feira, 17 de Novembro de 2009
Prosa poética à repartição de finanças
A repartição está cheia de gente que tudo diz mas nada sente. A partir do momento em que começamos a fazer parte da papelada, e temos as credenciais e as avenças como nossas irmãs, toda a nossa família se torna burocrática. Amanhã os anexos não podem chegar tarde à escola. No Natal, as directivas levam as mal se não lhes levarmos um belo naco de bolo rei. E a constituição, o que dizer da constituição? Está tão velha que o melhor mesmo é não a levar a sério.
Somos um filme de Charles Chaplin. Ainda vibramos com os acordes do Led Zeppelin e estranhamos a agressividade do Kusturica. São Pedro ri e chora às bandeiras despregadas. A sala, escura e etiquetada pelos tiquetes, é indiferente a tudo isso.O estado de tempo é um produto da sociedade cosmopolita. Modernices bah!
Esta estrada faz-se em montanhas de mecânica, elos conectos e dispersos até tudo fazer sentido. Na repartição tudo é um nirvana. Estamos no intermédio da nossa existência terrestre e dos seus compêndios e do requerimento da vontade dos deuses. Aqui nada se sente com fôlego cheio. É simplesmente um suspiro. Porque ninguém sonha ser profissional de repartição de finanças.
Quarta-feira, 21 de Outubro de 2009
Carta aberta a José Saramago
O Zé, eu não gosto dos teus livros, pá. Por isso também não os leio. Acho que há escritores muito melhores que tu e se fosse por mim nem tinhas recebido o Nobel. Seja como for és um tipo inteligente. Eu não te chamo português inteligente porque acho que tu não ias gostar. Chamo-te antes aquele tipo que se está a tentar eternizar a toda a força. E, diga-se de passagem, estás a conseguir!
Sabes, eu acho que Deus existe e sei que tu também concordas comigo. E eu nem sequer sou religioso. Nesta história da Bíblia até te dou razão. De facto, aquele livro foi escrito por homens errantes, de visão distorcida, com amores e ódios como qualquer um de nós. E pintaram Deus à sua imagem, tal como ele nos pintou supostamente à dele. Dizes tu que Deus “é vingativo, rancoroso e má pessoa”. Eu até que podia apostar que estavas a falar de um político. Mas não. Deixa lá!
Ao falar de ti, lembro-me das “materioskas”. É preciso tirar uma atrás da outra até chegarmos onde queremos. Mas, como sabes, eu nunca gostei muito desse tipo de brincadeiras. Portanto vou queimar as etapas. Pronto, já está. Sofres de “Síndrome de Galileu”. Conheces, não conheces? É aquele tipo que disse que a Terra afinal girava à volta do Sol e blá, blá, blá. Mas o pior é que toda a gente ainda fala dele hoje em dia, quando andamos aqui a ver se resolvemos o problema do aquecimento global e da crise internacional. Essa é que é essa!
O teu problema não é Deus, é o Cristiano Ronaldo. Quer dizer andaste anos a fio a escrever livros, a desfiar as pestanas e chega aquele tipo da Madeira, dá dois chutos numa bola e será lembrado por toda a Humanidade? Valha-me Deus. Mas eu acho que Ele te vai compreender e perdoar. E depois, na eternidade que espero que chegues primeiro do que eu, vê lá se arranjas umas horas para falar comigo, porque eu até gostava de ter conhecer.
Deixa-te mas é dessas ideologias de que nos devíamos anexar à Espanha, que os “panchitos” é que percebem do assunto, que a nossa nacionalidade não tem sentido. Olha, eu prefiro a tua nacionalidade sem sentido do que a minha visão de constantes movimentos bélicos independentistas. E depois sabes como as pessoas não se entendem, nem a martelo. Todos aos tiros é que não. Tu às vezes também és vingativo, rancoroso e má pessoa. Mas olha, escreve uma coisa mais alegre. Abraça-te às árvores, mostra como o mundo pode ser bonito, toca nas suas virtudes. Havia um francês que dizia que o mundo era belo quando se brincava com ele. E de resto, o pá, não me chateies, que eu acho que até sou boa pessoa!
Sábado, 8 de Agosto de 2009
Desafio literário
Hoje, aqui no blogue, quero fazer um desafio a mim mesmo. Será que escrever uma pequena história com personagens com nomes complicados retira brilho à narrativa? Em frente, ao bom estilo Vasco Granja! E nem sei como começar…
“Chega a uma altura da vida em que toda a gente se começa a dar lindamente. É esse o desígnio dos solteiros tardios, era esse o destino de Chriginsky e Agnieska. Os repletos de fé dizem que por muitas curvas que a vida dê, há-de sempre desembocar numa linha recta. A rotunda, neste caso, chamava-se Wan Min Lung. A amiga de ambos que, um dia, se lembrou de tornar realidade aquilo que a memória do telemóvel já se tinha apercebido há algum tempo.
Era tudo amor de novela. Assim o entendeu Agnieska quando, um dia, descobriu que Hipócrates Benquerença era apenas um produto das suas emoções aturdidas. Estranha essa coisa da emoção. A alegoria do coração saltitante acaba por se tornar baça a partir do momento em que precisamos de um cérebro para tornarmos os nossos sonhos realidade.
Esta, e outras conclusões, já tinha sido demonstrado por Arturos Sapalov. O velho mestre, que distraído de todo o redor descosia os pormenores, raramente falava em público. Mas aqueles ouvidos eram a crua imagem dos nossos tempos. Quanto mais nos aproximamos dos objectos menos os seus contornos saem definidos. Uma nova verdade de Jacques de Chabanne La Palisse. “
Quinta-feira, 7 de Maio de 2009
Capote e Instinto Fatal 2
Nos últimos dias vi “Capote” e “Instinto Fatal 2”. Sinceramente gostei mais do primeiro filme. Sempre tive uma grande curiosidade em conhecer mais em detalhe a vida de Truman Capote, um autor que eu considero genial na forma como consegue dar a conhecer os detalhes através de metáforas excepcional. Em “In Cold Blood” penso que ele faz algo de ainda mais interessante, mostrando ao leitor de que forma o malfeitor pode ter coração, da mesma forma que o voluntarista pode ter em si guardada e escondida uma ira.
Em “Instinto Fatal 2” é interessante ficar a conhecer o perfil psicológico de uma mulher manipuladora, que usa a sensualidade e o tacto feminino para conseguir os seus intentos. Para além destes aspectos, o facto de poderem existir pessoas viciadas em risco dá que pensar. Sim, porque se fizermos um enquadramento geral da vida chegamos à conclusão que os prudentes é que são malucos. Ficará, por certo, para outro post.
Deixo-vos, de cada um dos filmes, duas frases de interesse:
“Cavalos, manadas de gado, um amontoado de silos erguendo-se grandiosos como templos gregos, são vistos pelo viajante muito antes de a eles chegar”, Truman Capote
“ O grande problema da sociedade é que toda a gente fala, toda a gente discute, e no final não há sexo”Kathleen Turner, Instinto Fatal
Quarta-feira, 15 de Abril de 2009
A inutilidade da letra "H"
Já imaginaram um mundo construído sem a letra “H”? Dizem que para tudo na vida precisamos de ser práticos e, na minha opinião, o “H” é a letra mais dispensável do alfabeto e da língua portuguesa
Pois bem, atentemos bem a fundo na questão e verifiquemos a quantidade de dinheiro que se poderia poupar com a eliminação de uma letra nos teclados “qwerty uiop” convencionais. Teria, por certo, sido uma grande resposta à crise que atravessamos. Mas quem criou o alfabeto não se lembrou de hecatombes financeiras nem de possibilidades de aproximação ibérica.
Em termos práticas, podemos ver que a letra “H” no início das frases não produz qualquer efeito na palavra. Nas restantes aplicações podemos muito substituir o “H” pelo “~”
Machado = Macãdo
Banho = Baño
Toalha = Toalã
Com este tipo de metodologia do alfabeto, poderíamos chegar mais perto da fonética ibérica, aspecto fundamental na assumpção de uma economia una de vanguarda e de investimento agregado. Num mundo que contempla a matemática, nada melhor do que aplicar a mesma metodologia de simplificação em relação à gramática. Se o exercício fosse real e exequível, por certo que existiram resultados surpreendentes.
Há letras, também, que poderiam ser eliminadas do alfabeto. Falo do “v”, o que para nós nortenhos já acontece de forma automática. São estas pequenas revoluções que temos de fazer no nosso dia-a-dia, de modo a torná-lo mais fácil, enquadrado e eficaz. Nem que seja apenas no reino da fantasia.
PS- Post dedicado ao Ugo.
Sexta-feira, 9 de Janeiro de 2009
Quem tramou Peninha?
Mais do que um post, este é um autêntico desafio a todos os meus amigos que trabalham na área da animação. Depois de ter contado um pequeno episódio no atelier de escrita criativa, vou pegar na deixa da banda desenhada para vos falar um pouco mais desse grande rasgo de genialidade que dá pelo nome de Peninha.
Vá, eu confesso! Não raras vezes vou ao meu arquivo de BD repescar uma aventura do meu ídolo. Para mim, o Peninha é o ponto central e o Pato Donald e o Rato Mickey as personagens acessóras. È a representação da bondade mesclada na idiotice, da ingenuidade, da distracção. Significa a meninice que nunca queremos perder ao longo dos anos. Infelizmente, volvido todo este tempo, ainda não tive oportunidade de ver um almanaque de aventuras de Peninha, algo que seria fantástico de receber como prenda de aniversário. Penso também que nunca foi produzido.
Do mesmo modo, gostava de ver no cinema uma película do género “Quem tramou Roger Rabbitt” em versão Peninha. Não perderia por nada neste mundo, pois entendo que o potencial da personagem é imenso, sobretudo quando se interliga com o restante universo de Patópolis. Por conseguinte, o seu sobrinho Biquinho seria também um pólo de gargalhada. Fica aqui o desafio, em prol da satisfação de todos os afficionados mundiais de Peninha.
Gostava que esse trabalho fosse um exemplo de alegria, de diversão e de humor infantil que tanto estamos necessitados. Se concordo que todos gostamos, por momentos, de voltar à nossa infância, considero que esta personagem é o veículo ideal para nos esquecermos das responsabilidades e dos compromissos, navegando com um sorriso pelos mares da imaginação.
E digo mais, hei-de fazer um conto com o Peninha como personagem. Assim a minha imaginação, e o meu sentido de justiça, o exigem!
Quarta-feira, 7 de Janeiro de 2009
Um episódio com Mário Claúdio- O Gil é um fingidor!
Por certo que já ouviram a expressão “O poeta é um fingidor”. Eu não sou poeta, apenas tenho o gosto pela escrita e a adaptação a um novo rascunho. De facto, “o Gil é um fingidor”. Finjo que não vejo. Se algumas pessoas tivessem noção das coisas que me apercebi e que fingi que não vi, teria uma espécie de boom de afastamentos. Mas como também não me quero tornar mesquinho, apenas deixo que tudo passe para um armário invisível. Até porque vão comigo para o túmulo encenações, flirts, chamadas de atenção ou palhaçadas, se quisermos concluir. Podem estar descansados/as!
Mas não resisto a uma pequena história. No ano passado, na Fundação de Serralves, fui admitido num curso de escrita criativa ministrado por Mário Claúdio. A sua cultura, capacidade criativa e versatilidade são inquestionáveis, ocupando justamente um trono que bem merece, como vulto incontornável da literatura portuguesa. Mas não há homens perfeitos, e no meio do conhecimento que me foi transmitido houve algo que me chamou particularmente à atenção. Numa aula, Mário Claudio pediu-nos um trabalho relacionado com o fogo e a Natureza. Não me lembro muito bem sobre o que versei mas, chegada a minha vez de ler o trabalho, o mesmo causou uma reacção no Prémio Pessoa que me surpreendeu totalmente.
“Sabe que nós temos uma espécie de sexto sentido. Dá para ver perfeitamente que você gosta de ficção científica e de banda desenhada”.
Acreditem que já experimentei ver vários filmes e decididamente não gosto de ficção científica. Se na televisão estiver a dar o Star Trek e “Na Roça com os Tachos”, eu prefiro o programa culinário do cabo-verdiano. Quanto à banda desenhada, é verdade que sou apreciador e de quando em vez lá me perco em Peninhas ou Cariocas. Estou longe, no entanto, de ser um apaixonado e um consumidor compulsivo.
Mas pensei. O que ganhava se o fosse a contrariar? Na minha optica, apenas um contorno da questão, ou seja, não vi os filmes apropriados mas a minha imaginação para aí deambulava. Ou que o Peninha e o Carioca não eram boas influências para a minha grande paixão. Assim, mentindo, optei por concordar com ele.
“Sim, é verdade. Como adivinhou?”
Mário Claúdio é um individuo extremamente simples e acessível. E justamente admirado. Na turma sucederam-se os elogios ao seu sexto sentido, ao seu tacto literário apurado, ao hino exacerbado ao pormenor. E eu, naquela cadeira, fingia que estava tudo bem. Que nunca me interessei por viagens ou futebol enquanto toda a gente falava de cenas de obras dele que eu jamais tinha lido. Gosto, e tantas e tantas vezes, de estar no controlo da situação sem que ninguém disso se aperceba.
A partir desse dia comecei a separar o meu caderno de aula. De um lado os ensinamentos recolhidos em relação a situações factuais; do outro as opiniões e os pensamentos de Mário Claudio. Se de um lado nada discuto, do outro coloco em causa. Porque noutros momentos das aulas não me convenceu em termos de perspicácia. Não que ponha em causa o seu perfil. Mas coloca uma visão da realidade e do mundo que não tem necessariamente de ser igual à minha. E dividi, dividi, dividi!
Segunda-feira, 29 de Dezembro de 2008
A táctica do poio romântico
Ando a dar uma grande importância à minha criação literária. Se bem que consiga retirar algum prazer daquilo que faço, devo dizer que encaro a actividade muito seriamente como fonte de rendimento futura. Além do mais, quem disse que a arrogância é um defeito e a humildade uma virtude?
Para melhorar, faço constantemente exercícios para aumentar a minha criatividade e a minha capacidade de produção. No âmbito do conto “Amo-te num saco de cimento” dei por mim, no passado sábado, a tentar relacionar um poio com o conceito de romantismo.
Deixo-vos o resultado final para a leitura do conto mas deixo-vos umas achegas, sobretudo ao nível da solução encontrada. Peguei no conceito de beleza estabelecida e voltei a desenhá-lo à medida das minhas necessidades. Imaginemos um sol preto sinónimo de terror ou estrelas cadentes que representam ofuscamento em vez de brilho.
E assim comecei a construir, enfiado numa redoma por mim desenhada. E o trabalho, bem ou mal, lá que surgiu em forma de conto. Mas o exercício continua. E agora estou a alarga-lo a pessoas. Aqueles que me dizem mais vou debulhar os seus pontos fracos e dá-los a conhecer. Os que menos me dizem, faço ao contrário. Confesso que este segundo ponto é bem mais complicado.
Sexta-feira, 28 de Novembro de 2008
Contra a morte de Batman
Nos últimos tempos, tivemos oportunidade de assistir à morte de alguns dos grandes heróis que fizeram tantas vezes parte da nossa fantasia. O Homem-Aranha, atingido por um caçador furtivo, e o Super-Homem foram as últimas vítimas de uma súbita onda de destruição destes fenómenos.
Agora, pelos vistos, chegou a vez do Batman. Desdobram-se na Internet os rumores sobre quem será o assassino. O argumentista Grant Morrison desvendou um pouco do véu, ao afirmar que para Batman estava reservado um destino pior que a morte.
Como não estou à espera de ver um Batman com uma doença terminal, aguardo pacientemente, mas com curiosidade, sobre o desfecho deste episódio que não me agrada minimamente. Já diz o nosso poeta que há indivíduos “que da morte se vão libertando”. Embora compreendendo os factores económicos que possam estar por trás deste desfecho, não devo deixar de dizer que a morte de Batman é um cenário negativo. Para mim, estes fabulosos produtos da imaginação deveriam conseguir fintar a morte, sendo sempre ícones da vitória do bem contra o mal. Não merecem morrer, deixando os seus fãs numa angústia de não mais se poderem deliciar com as suas aventuras.
Porque não matam o Joker? A haver justiça na banda desenhada, ao menos que retrate o fim dos vilões. Seria uma boa forma de se manter o dinamismo económico necessário à moda da personagem, colocando os dois patamares da balança- bem e mal- sob o ponto de vista da justiça. É certo que tal não acontece na vida real mas...deixem-nos sonhar!!!
Quinta-feira, 4 de Setembro de 2008
Luciana Stegagno Picchio
Foi uma das maiores promotoras da língua e da literatura portuguesa, tendo tido uma forte ligação afectiva a Portugal e à nossa cultura. Faleceu no passado dia 28 de Agosto, em Roma, deixando um legado que a língua portuguesa não pode deixar de lado.
Na sua carreira foi responsável por mais de quinhentas publicações dedicadas à literatura e cultura, sendo considerada uma das maiores difusoras do luso-brasileirismo de todo o mundo.
De entre as suas obras destaque para “História do Teatro Português” ou “Lição do Texto”, onde constam várias críticas sobre autores portugueses. O seu trabalhou debruçou-se também sobre poesia e prosa medieval, renascentista e moderna.
À data da sua morte, Luciana Stegagno Picchio era professora emérita da Universidade de Roma “La Sapienza”. Na sua vida foi professora visitante em muitos países, entre os quais Portugal, Brasil e Estados Unidos.
A sua carreira académica começou com a obtenção de uma licenciatura em arqueologia grega pela Universidade de Roma. Depois, participou em várias publicações científicas e editoriais italianas e internacionais. Destaque para o seu trabalho de colaboração com o linguista Roman Jakobsen no âmbito de um estudo feito sobre literatura medieval e moderna portuguesa.
A sua vida foi muito marcada pela análise a textos de grandes vultos da literatura portuguesa, como Fernando Pessoa ou José Saramago, mas a literatura brasileira também não foi esquecida.
Sobre este dois temas se debruçou no jornal “La Republica”, onde tinha uma coluna da sua responsabilidade.
O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, já lamentou publicamente o desaparecimento da autora.